"a questão ambiental deve ser trabalhada não como resultante de um relacionamento entre homens e a natureza, mas como uma faceta das relações entre os homens, isto é, como um objeto econômico, político e cultural". (MORAES, 2002)

sexta-feira, 8 de dezembro de 2023

A Vila Operária, por Kátia Campos

O texto a seguir, elaborado pela historiadora e demógrafa ouropretana Kátia Maria Nunes Campos, está juntado às fls. 759 a 785 do Inquérito Civil Público autuado sob o número MPMG-0461.14.000509-5, da Promotoria de Justiça de Ouro Preto (clique aqui e leia):

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"A VILA OPERÁRIA 

Uma rara exceção foi a Vila Operária, construída pelo primeiro diretor, Dr. Américo René Gianetti, nas décadas de 1930-1940, totalizando menos de 100 casas e alojamentos de solteiros. Parte dessas edificações foi alienada pela concessionária da época (ALCAN) às famílias de operários, com a expressa autorização da Municipalidade, como titular e senhora dos terrenos, que expediu os títulos de domínio para registro de escrituras em cartório. Entretanto, a fábrica alcançou um número de empregados superior a 2.000 pessoas, sem contar empreiteiros, sem que houvesse expansão dos esforços de minimizar a responsabilidade social da empresa, aproveitando os terrenos cedidos. 

Cumpre observar que a Vila dos Operários foi construída em encosta íngreme e fronteira à fábrica, em local insalubre, recebendo por décadas, o impacto da fumaça fétida, poeiras e os poluentes deletérios decorrentes das atividades da fábrica, antes e depois das legislações ambientais. Uma fotografia da Vila Operária, datada de cerca de 1940 a 1950 demonstra claramente a má escolha de sua localização e as condições desfavoráveis suportadas pelas famílias moradoras. Algumas casas encontram-se a poucos metros de um precipício. 

Figura 1 - Linha férrea nos fundos da fábrica. Ao fundo, a Vila Operária

A localização da Vila Operária tão próxima das instalações obedece a uma mentalidade da época, que favorecia o controle social sobre a vida privada dos operários que, além da esperada "gratidão" pela moradia fornecida pela "generosidade" da empresa, ainda eram mantidos sob a vigilância atenta de seus empregadores. 

Na década de 1970, na contramão da preocupação com os problemas fundiários e no auge de movimento migratório desencadeado pela expansão da fábrica e instalação da nova fábrica de cabos, uma rua inteira ladeada por moradias destinadas a operários foi demolida, dando lugar a um estacionamento, na atual Avenida Simão Lacerda, em frente ao campo de futebol. A empresa, uma vez mais, manteve suas terras desimpedidas, recorrendo à prefeitura para doar terrenos adicionais para a construção de novas moradias populares, com financiamento da Caixa Econômica. 

Não conhecemos estudos que analisem os efeitos dessa poluição na saúde dos moradores e nos operários da fábrica.  Meu primo José Eustáquio Guedes, aluno dessa escola e morador a menos de 50 metros da escola, faleceu em meados da década de 1950, vitima de câncer na garganta. Meu tio Vasco Aguiar Nunes, químico prático da empresa, também faleceu de câncer na garganta, na década de 1970. Não sabemos se houve relação do desenvolvimento da enfermidade e as condições ambientais vigentes na fábrica e na sede do município, devido à falta de estudos conhecidos pertinentes. 

Figura 2 - Alunos da Escola Municipal René Gianetti (sic) [o correto é Tomás Antônio Gonzaga], na estrada da Vila Operária. A insalubridade vem afetando inclusive os alunos da escola, construída na entrada da Vila dos Operários, que conviviam inescapavelmente com a pesada poluição, conforme se vê nessa fotografia de alunos do início da década de 1960, no pátio da escola. Há notícias de um estudo que teria sido encomendado ao Dr. José Pedro pela Alcan, mas os resultados e o laudo não teriam sido divulgados. (A informação me foi dada pela Dra. Sylvia Martinez, filha do referido médico). 

Em outros casos, como na rua Felinto Elísio Nunes, os operário adquiriam lotes à Empresa, com títulos de domínio igualmente confirmados, pelo Município, sem ressarcimento ao erário. Encontra-se, na Prefeitura, uma lista e o histórico dessas aquisições."

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O texto acima, apesar de se referir mais às décadas iniciais da fábrica, é plenamente aplicável aos atuais moradores da Vila Operária, cujos impactos do processo fabril ainda estão presentes, inclusive na Escola Tomás Antônio Gonzaga, que funciona no mesmo lugar, há poucos metros de distância dos tanques de soda cáustica e de gás natural da Actech. 

A fábrica e sua poluição vista da Vila Operária, em 06/06/2023

Foto tirada em 24/06/2022 a partir do bairro Tavares, demonstrando como o fumaça da fábrica é direcionada para a Vila Operária e o Campus da UFOP

Foto tirada em 11/05/2022 a partir do Campus da UFOP, demonstrando a fumaça da Actech contida sobre a Vila Operária pela inversão térmica.

A fábrica vista da Vila Operária, em 18/07/2014 - no canto inferior direito, o pátio da Creche Colmeia.


A fábrica vista da Vila Operária, em 16/01/2014 - fumaça preta intensa

Quadra da Escola Municipal Tomás Antônio Gonzaga
coberta por pó branco de alumina, em 15/07/2015

 

Rio Funil colorido por rejeitos de bauxita, em 12/05/2014 

quinta-feira, 30 de novembro de 2023

Nexus, na Rancharia, obtém licenciamento ambiental

Conforme Parecer nº 144/FEAM/URA CM - CAT/2023, emitido no processo 2090.01.0007081/2023-68 (clique aqui e veja), a empresa Nexus Ligas – Unidade Ouro Preto, localizada na Rancharia, pertinho de Saramenha, obteve o CERTIFICADO Nº 3162 LICENCIAMENTO AMBIENTAL CONCOMITANTE (clique aqui e veja), pelo qual foi autorizada a funcionar até 23/11/2033. 

Do referido parecer cabe destacar a seguinte afirmação: "conclui-se que a empresa vem cumprindo de forma regular as condicionantes impostas quando da concessão da sua REVLO". Na fábrica de alumina de Saramenha, noutro giro, as condicionantes são sistematicamente desrespeitadas e de brinde o Governo do Estado lhes dá mais um TAC permitindo o funcionamento precário...


A insustentável leveza do alumínio: impactos socioambientais da inserção do Brasil no mercado mundial de alumínio primário

Compartilho com os leitores do Blog um interessante artigo sobre a produção de alumínio primário no Brasil, desde a extração da bauxita, que "defende a tese de que a inserção do Brasil no mercado global do alumínio faz parte de uma nova configuração da Divisão Internacional do Trabalho (DIT), cujas atividades econômicas poluentes e altamente dependentes de energia, como o caso deste metal, vêm se deslocando para nações periféricas ou emergentes, onde muitas vezes as legislações são menos austeras, do mesmo modo como são menos influentes os movimentos ambientalistas e as reivindicações das populações atingidas nos territórios afetados em seus direitos à saúde, ao ambiente saudável e à cultura"

"Insumos, Emissões e Efeito Estufa

A redução da bauxita em alumina e, posteriormente, a transformação desta em alumínio, consome um volume considerável de insumos. Somente para a produção de alumina, no ano de 2009, foram consumidos 950,7 mil ton. de óleo combustível; 816,8 mil ton. de soda cáustica; e 128,7 mil ton. de cal. Para a produção de alumínio, em 2009, além de 23.713,8 GWh de energia elétrica e de 2.880,6 mil ton. de alumina, foram necessários 532,5 mil ton. de coque; 166,2 mil ton. de piche; 32,8 mil ton. de fluoreto; e 2,4 mil ton. de criolita, todos insumos que contêm inúmeras substâncias tóxicas8.

A dimensão das poluições atmosféricas originárias das indústrias produtoras de alumínio pode ser melhor dimensionada ao analisarmos alguns relatórios produzidos pelas secretarias e órgãos estaduais de meio ambiente. Em Minas Gerais foi elaborado, com base nos indicadores de 2005, um inventário relativo às emissões de gases de efeito estufa, segundo as atividades socioeconômicas. No setor de processos industriais, a indústria do alumínio participou com 13% do total de emissão de gases, ficando atrás, apenas, das indústrias de cimento (43,9%) e cal (38,2%)39. Já no inventário de emissões de fontes fixas de CO², elaborado pela CETESB40, em 2008, as indústrias de minerais não metálicos (nesta tipologia estavam incluídos além da produção de alumínio primário, fornos de cal, cimento e produção de vidro) no estado de São Paulo, ocupavam a segunda posição como emissores de CO², contribuindo com 26,4% do total estadual. Já no ranking das empresas que mais emitiram CO² em 2008, a CBA se apresentou na sexta colocação. Outros inventários de outros estados da federação também apontam o potencial emissor de CO² das indústrias de alumínio primário: na Bahia, em inventário produzido pela Secretaria de Meio Ambiente41, referente ao ano de 2008, a indústria de alumínio primário emitiu 6,5% do total de CO², se posicionando na sexta colocação. No estado do Rio de Janeiro, a indústria do alumínio, ranqueou-se na quinta colocação em volume de emissões totais de gases do efeito estufa em 2005 e em primeiro lugar, entre as indústrias, em emissões de metano e óxido nitroso42. Nos Estados Unidos, dois fatos relacionados às emissões de gases tóxicos pelas indústrias de alumínio chamam a atenção: um diz respeito à subnotificação das emissões por parte das empresas que são captados pelos inventários da EPA; outro sugere a diminuição das emissões devido ao deslocamento das empresas para o exterior"

Fonte: HENRIQUES, A. B., & Porto, M. F. S.. (2013). A insustentável leveza do alumínio: impactos socioambientais da inserção do Brasil no mercado mundial de alumínio primário. Ciência & Saúde Coletiva, 18(11), 3223–3234. https://doi.org/10.1590/S1413-81232013001100013



quarta-feira, 8 de novembro de 2023

Médico recomenda distanciamento de criança asmática da fábrica de Saramenha

 Eis a recomendação médica à uma criança moradora da Vila Operária:

"A criança acima é portadora de asma brônquica, tendo sido atendida por mim no início do mês corrente, em uma crise grave após aspirar fumaça emitida por uma fábrica próxima à sua residência. É salutar que a criança permaneça evitando contato com esses desencadeantes, pois do contrário, o risco de crise será grande com a sua condição de saúde podendo ser afetada".  



sexta-feira, 29 de setembro de 2023

ChatGPT, "quais os danos ambientais da produção de alumina?"

Perguntei ao ChatGPT: quais os danos ambientais da produção de alumina? Vejam a resposta:

"A produção de alumina, que é o estágio intermediário na fabricação de alumínio, pode causar diversos danos ambientais. Esses danos podem variar dependendo dos métodos de produção utilizados, mas geralmente incluem:

1. Emissões de Gases de Efeito Estufa: A produção de alumina envolve o processamento da bauxita, um minério de alumínio, que geralmente requer o uso de energia intensiva, como a queima de combustíveis fósseis. Isso pode resultar na emissão de dióxido de carbono (CO2) e outros gases de efeito estufa, contribuindo para as mudanças climáticas.

2. Desmatamento e Degradação Ambiental: A mineração de bauxita para a produção de alumina muitas vezes envolve a remoção de vegetação natural e pode levar ao desmatamento e à degradação de ecossistemas locais. Isso pode afetar a biodiversidade e causar problemas como a erosão do solo.

3. Poluição da Água: A extração e o processamento da bauxita podem gerar resíduos contendo produtos químicos tóxicos, como ácido sulfúrico e soda cáustica. Se esses resíduos não forem adequadamente gerenciados, eles podem contaminar rios, lagos e aquíferos próximos, prejudicando a qualidade da água e a vida aquática.

4. Consumo de Energia: A produção de alumina consome grandes quantidades de energia, principalmente na etapa de refino. Isso pode resultar em uma pegada de carbono significativa, especialmente se a energia for gerada a partir de fontes não renováveis.

5. Resíduos Tóxicos: A produção de alumina gera resíduos sólidos e líquidos, alguns dos quais podem ser tóxicos. O manejo inadequado desses resíduos pode causar contaminação do solo e da água.

6. Consumo de Água: A produção de alumina também requer grandes volumes de água para processos de lavagem e refino. Em regiões onde a água é escassa, isso pode representar um desafio significativo para a disponibilidade de recursos hídricos locais.

7. Impactos sobre Comunidades Locais: A mineração e a produção de alumina podem ter impactos sociais significativos sobre as comunidades locais, incluindo o deslocamento de pessoas, a interrupção de modos de vida tradicionais e problemas de saúde relacionados à exposição a produtos químicos tóxicos.

É importante destacar que muitas empresas do setor de alumínio têm adotado práticas mais sustentáveis e estão trabalhando para reduzir esses impactos ambientais por meio de medidas como o uso de energia renovável, reciclagem de alumínio e melhores práticas de gestão de resíduos. No entanto, ainda é essencial monitorar de perto a indústria e pressionar por padrões mais rigorosos de sustentabilidade e responsabilidade ambiental."




Actech continua buscando licenciamento ambiental



segunda-feira, 21 de agosto de 2023

Moradores de Saramenha reclamam da queda de minério das cargas dos caminhões

Matéria da rádio Itatiaia disponível em: https://www.itatiaia.com.br/editorias/ouropreto/2023/08/04/moradores-de-saramenha-reclamam-da-queda-de-minerio-das-cargas-dos-caminhoes 


Empresa Actech responde às acusações e moradores insistem nos problemas reais

Por Matheus Renovato  - Ouro Preto

04/08/2023 às 09:31


A Rádio Itatiaia Ouro Preto recebeu diversas reclamações de moradores do bairro Saramenha em relação à frequente queda de minério das cargas dos caminhões que prestam serviço para a empresa Actech e transitam pela região. Segundo os relatos, essa situação tem causado uma considerável quantidade de poeira nas vias públicas, que acaba infiltrando-se nas residências, gerando transtornos relacionados à limpeza. A falta recorrente de água no bairro torna ainda mais difícil a tarefa de remover os resíduos.

Diante dessa situação, a empresa Actech foi procurada para esclarecer as medidas que serão adotadas para resolver essa questão. Em nota, a empresa afirmou ter conhecimento da falta de água no bairro, mas negou as acusações de poeira nas ruas com base em imagens fornecidas pelo vice-presidente da Associação dos Bairros, que mostram as ruas aparentemente limpas e a ausência de denúncias em seu portal.

Entretanto, os moradores reforçam a veracidade dos problemas enfrentados em relação à poeira do minério. Apesar das imagens apresentadas, muitos residentes do bairro continuam relatando questões reais relacionadas à poeira que resulta da queda de minério das cargas dos caminhões que circulam pela região.

A situação permanece em destaque, e a comunidade espera que as devidas providências sejam tomadas para solucionar esse incômodo, garantindo assim um ambiente mais limpo e saudável para todos os moradores do bairro Saramenha.



quarta-feira, 5 de julho de 2023

Pó, pó e mais pó... a rotina na Vila Operária

 A foto abaixo, tirada na garagem da minha casa (que é coberta!) exibe a rotina de limpeza de quem mora na Vila Operária. 


Foto tirada em 05/07/2023, na Vila Operária