"a questão ambiental deve ser trabalhada não como resultante de um relacionamento entre homens e a natureza, mas como uma faceta das relações entre os homens, isto é, como um objeto econômico, político e cultural". (MORAES, 2002)

quinta-feira, 2 de junho de 2022

Agência Primaz: Fumaça expelida por fábrica preocupa moradores de Ouro Preto

Imagens mostram poluição tomando bairros e até o campus da Universidade Federal de Ouro Preto


Por Rômulo Soares, 02/06/2022, 10:20 - Agência Primaz de Comunicação


Mais uma vez, moradores da região da Bauxita, em Ouro Preto, reclamam do grande volume de poluição gerada pela fábrica de alumínio, localizada em Saramenha. Há aproximadamente três meses, a Alumina Chemical Technology (Actech) assumiu as operações da unidade, que pertencia à Hindalco, e herdou problemas relacionados à emissão de fumaça, fuligem e mau cheiro. Moradores acreditam, inclusive, que a emissão de particulados aumentou com a nova gestão.

Durante o mês de maio, alguns vídeos e fotos foram publicados por moradores da região da Bauxita, denunciando a quantidade de fumaça que tem saído das chaminés das caldeiras, além de um pó branco proveniente da produção de alumina. Estima-se que aproximadamente 120 famílias são afetadas diariamente com a poluição gerada pela fábrica.

“Nós convivemos há décadas com a emissão de pó de alumina e de particulados muito finos que precipitam sobre a Vila Operária e outros bairros próximos, como a Bauxita. A gente não sabe qual é a gravidade disso. Imagina, pessoas ficarem absorvendo esse pó durante 10 ou 30 anos ininterruptamente, não sabemos os malefícios que podem trazer à saúde. Também tem um cheiro muito forte, também tem caído uma fuligem preta e todo dia temos que tirar uma quantidade significativa de pó”, relata o presidente da Associação dos Moradores da Vila Operária, Luiz Carlos Teixeira, à Agência Primaz.

De acordo com Luiz, mesmo com as constantes mudanças de gestão da unidade, a relação entre a empresa e a comunidade é muito conflituosa. Ele conta que já faz anos que acontecem reuniões entre ambas as partes, mas não há nenhuma mudança nas ações da fábrica. “São muitas promessas e pouca ação efetiva. Geralmente apresentam um plano daquelas ferramentas de qualidade, mas queremos a redução de emissão de poluentes, filtragem e monitoramento”, complementa.

A Prefeitura de Ouro Preto não tem fiscais específicos e nem equipamentos para realizar alguma aferição sobre o caso. Coube, então, à administração municipal, oficializar o órgão estadual, Fundação Estadual do Meio Ambiente (FEAM), que é o licenciador e fiscalizador da atividade. Além disso, foi criada uma comissão dentro do Conselho Municipal de Desenvolvimento Ambiental (Codema), composta por representantes da localidade da Vila Operária, da Secretaria do Meio Ambiente e da empresa para tratativas acerca deste tema.

Enquanto Hindalco, a fábrica não possuía licenciamento ambiental expedido pela Secretaria de Estado de Meio Ambiente para poder operar, tendo seu funcionamento autorizado mediante um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC), firmado em abril de 2021, e que foi renovado recentemente. Porém, segundo Luiz Carlos, o TAC foi conquistado pela Hindalco sem que algumas condicionantes fossem cumpridas.

“Com relação ao licenciamento, houve uma mudança no CNPJ, saiu a Hindalco e entrou a ACTECH. Então, eles entraram com um pedido, solicitando a renovação do TAC que estava vigente à Hindalco junto ao Estado e ainda não houve um retorno”, informa o secretário de Meio Ambiente de Ouro Preto, Chiquinho de Assis, à Agência Primaz.

Durante a 30ª reunião ordinária da Câmara de Ouro Preto, ocorrida na terça-feira (24), foram aprovados, por nove votos, dois documentos relacionados ao assunto, ambos de autoria do vereador Matheus Pacheco (PV). O primeiro é a Representação 147/2022, “a ser encaminhada à Empresa ACTECH solicitando informações quanto à concretização do Termo de Ajuste de Conduta (TAC) de Desenvolvimento Ambiental firmado pela empresa Hindalco”. Já o segundo é o Requerimento 151/2022, “a ser encaminhado à Procuradoria do Município, buscando conhecer a existência de ações, denúncias ou procedimentos administrativos e jurídicos em aberto, em referência à emissão de fumaça produzida pela antiga Empresa Hindalco, atualmente denominada ACTECH”.

De acordo com Matheus Pacheco, a Câmara de Ouro Preto já convidou a Actech para que fossem explanadas as intenções da empresa na cidade, mas não houve resposta. “Sabemos que essa é uma pauta antiga, mas que não pode se tornar utopia. Quem passa pela empresa em Saramenha, não consegue perceber grandes investimentos para tentar mudar essa realidade. Sabemos da importância dos postos de emprego que são gerados pela empresa, mas não podemos nos calar e fechar os olhos para o crime ambiental que a empresa comete”, declara.

Outro motivo de preocupação do vereador é quanto aos efeitos da poluição em duas unidades de ensino que se encontram na Vila Operária: a Creche Colmeia e a Escola Municipal Tomás Gonzaga. “Estudei lá no Ensino Fundamental e convivi com aquela fumaça. Hoje a realidade é a mesma, dos meus pais também foi a mesma. Algo precisa ser feito de forma concreta”, finaliza.


Reuniões do Codema


Na quinta-feira (26), a Actech se reuniu com o Codema para tratar da fumaça expelida pela fábrica. Nela, alguns itens foram pactuados:

  • Instalação de medidores de emissão de particulados;
  • Instalação de uma estação de monitoramento do ar na Vila Operária;
  • Mitigação do pó em suspensão por meio da aspersão de água;
  • Estabelecimento de comunicação mais eficaz entre a fábrica e a comunidade;
  • Apresentação dos documentos legais de garantia de funcionamento.

A Agência Primaz tentou contato tanto com a Actech quanto com a Terrabel — grupo que administra a Actech —, mas não houve resposta. Ao Estado de Minas, o CEO da Terrabel, Maurício Gontijo, disse que a unidade possui uma produção de 280 toneladas de alumina por dia e, para dar conta da demanda, existem dois fatores que emitem fumaça: a queima de biomassa e a calcinação, que é feita em três fornos. Segundo Gontijo, a empresa trocará o combustível desses fornos para um combustível mais limpo, saindo do petróleo bruto para o gás liquefeito de petróleo (GLP).

Quanto ao mau cheiro, Gontijo disse ao EM que é proveniente da soda é usada na fabricação, mas que não há nenhum dano à saúde. De acordo com o gestor, a Actech faz monitoramentos ambientais relativos às emissões atmosféricas, ruídos, efluentes líquidos e superficiais regularmente, estando credenciados nas regras do Conselho de Política Ambiental (Copam).

No dia 19 de maio, também houve uma reunião do Codema. Na ocasião, Alexandre Mortimer Guimarães, representando a Actech, explicou qual é a situação em relação ao pedido de renovação de licença de operação, que foi indeferida pela Semad quando a fábrica ainda era operada pela Hindalco, em razão de descumprimentos de condicionantes. “No dia 5 de abril de 2021, foi firmado um TAC, com uma série de condicionantes, com a validação de um ano. Dentro do prazo, foi apresentado um pedido de prorrogação do prazo, já visando a alteração para a Actech. No dia 29 de março de 2022, antes do vencimento do TAC, foi expedido um ofício pela Semad, prorrogando o TAC da empresa até que fossem analisadas todas as condicionantes”, afirmou Guimarães. 

O professor do Departamento de Engenharia Ambiental da UFOP, Guilherme José Cunha, teve acesso ao laudo da Hindalco no fim do ano passado. De acordo com o docente, todas as quatro estações monitoradas estavam abaixo do limite estabelecido pelo padrão nacional e estadual. Entretanto, segundo ele, havia outros dados que não estavam legíveis, como, por exemplo, quanto à calibração dos equipamentos. “Foram poucos, apenas quatro parâmetros que estavam no relatório, e eles estavam de acordo com a legislação”, diz.

Um dos pedidos de Guilherme à Actech é a instalação de uma estação de monitoramento na Vila Operária, já que o maior número de reclamação vem de pessoas que vivem em bairros próximos à fábrica.

“Nós sabemos que não vai resolver o problema da poluição, mas vai traduzir numa medição técnica aquilo que nós vemos e sentimos todos os dias. Nós estamos cansados de fazer vídeo, foto e isso não ter valor legal para o licenciamento. Queremos uma medição técnica que demonstre claramente o que sofremos no dia a dia”, declara André Lana, morador da Vila Operária, corroborando com o pedido do professor da UFOP.

Há anos, André Lana relata, denuncia e registra indícios de malefícios que a produção da fábrica faz. Porém, ele diz que já perdeu a esperança de alguma providência por parte do poder público ou mesmo pela empresa e teme que aconteça alguma tragédia. “Chegamos em um ponto de falar tanto e nada ser feito, principalmente porque há, por parte das autoridades, o medo do desemprego. Eu só acredito que vai acontecer alguma providência quando uma tragédia acontecer. Vazar um gás ou explodir uma caldeira, matar um trabalhador ou estudante. Aí, quando acontecer a tragédia, nós vamos ter todo o histórico para mostrar as omissões no processo”, desabafa.

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