09/06/2014 | 08:28 - Atualizado em: 09/06/2014 | 08:28
Dono da terceira maior reserva de bauxita, matéria-prima do alumínio, país acumula queda no embarque do produto final
Rio - Na semana passada, trabalhadores da unidade da Alcoa em Poços de Caldas, no sul de Minas, se reuniram para votar os termos do acordo que conclui um processo de demissão em massa da unidade de alumínio primário da empresa no município. O número exato de demitidos ainda não foi informado, mas o sindicato local estima entre 300 a 400 pessoas, um pouco menos de 10% do contingente de 5 mil trabalhadores do setor metalúrgico da cidade. “Agora, nossa bauxita vai sair daqui para gerar emprego em outro local”, lamenta o presidente do Sindicato dos Metalúrgicos de Poços de Caldas, Ademir Angelino.
Um dos principais produtores brasileiros de bauxita, Poços de Caldas é também a cidade mais prejudicada pelo novo movimento de retração da produção brasileira de alumínio primário, que, segundo os produtores, tem como justificativa as “condições desafiadoras do mercado global”. Nos últimos anos, praticamente todos os grandes produtores anunciaram redução – temporária ou definitiva - de capacidade no Brasil. Além de Poços de Caldas, foram fechadas unidades em Aratu (BA) e Ouro Preto (MG).
“Temos hoje uma capacidade ociosa de cerca de 500 mil toneladas de alumínio primário por ano”, calcula o presidente da Associação Brasileira da Indústria do Alumínio (Abal), Adjarma Azevedo. Nos tempos áureos, pouco antes da crise global de 2008, o Brasil chegou a produzir 1,6 milhões de toneladas por ano. Hoje, a capacidade em operação garante apenas 1,1 milhão de toneladas. E a tendência é que, mantidas as condições atuais, medidas drásticas continuem a ser tomadas.
O alumínio primário resultado do processo de redução da alumina (extraído da bauxita em refinarias específicas) com o uso de grandes cargas de eletricidade. O Brasil tem a terceira maior reserva mundial de bauxita e 10% da capacidade global de refino de alumina — incluindo a maior refinaria mundial, da Alunorte, no Pará – o suficiente para garantir uma produção de até 5 milhões de toneladas de alumínio primário por ano.
O setor, porém, parece seguir os passos da indústria siderúrgica, que hoje vem sofrendo ataques com a importação de aço semi acabado, embora esteja ao lado de algumas das maiores jazidas mundiais de minério de ferro. “O alumínio primário já foi um item importante das exportações brasileiras. Hoje, vendemos mais alumina”, diz Azevedo. A matéria-prima acaba sendo reduzida em outros países, que vendem o produto semiacabado a clientes brasileiros, como fabricantes de latas e cabos e indústria automobilística, entre outros.
Também como na indústria siderúrgica, as dificuldades do setor têm origem externa mas são agravadas por fatores internos. Após crise mundial, com a queda no consumo de países desenvolvidos, todo o investimento em ampliação da capacidade global se transformou em sobreoferta do produto —a capacidade ociosa beira as 5 milhões de toneladas. A cotação do lingote de alumínio despencou de um teto de US$ 3 mil, em 2008, para os atuais US$ 1,7 mil por tonelada.
“Em todo o mundo, estamos tomando medidas para reduzir a capacidade de produção dos smelters (fornos de redução) que não são competitivos e reposicionar nosso perfil de custos”, afirmou a Alcoa no comunicado em que anunciou a redução de capacidade no Brasil. Estão sendo fechadas três das quatro linhas de produção em Poços de Caldas – a primeira já havia sido descontinuada no ano passado – e uma linha em São Luis (MA). Incluindo as medidas tomadas no ano passado, a redução de capacidade da empresa no país chega a 270 mil toneladas por ano.
“Apesar do trabalho duro para tornar nossas operações mais competitivas, fomos forçados a tomar medidas difíceis em relação à nossa produção de metal primário no Brasil, em função das condições de mercado que enfrentamos”, continua, na nota, Bob Wilt, presidente da Divisão Global de Produtos Primários da Alcoa. O texto lamenta os impactos sobre a força de trabalho, mas diz que a medida é irreversível.
Azevedo, da Abal, diz que as condições do mercado externo são agravadas, no Brasil, pelo alto preço da energia. “Com demanda aquecida e altas cotações, era possível manter a produção mesmo sem competitividade. Mas a cotação US$ 1,7 mil por tonelada não é suficiente para pagar os custos”, argumenta. Segundo ele, a indústria brasileira de alumínio paga pela energia o equivalente a US$ 60 por megawatt-hora (MWh), o dobro da média mundial — excluindo a China. A energia representa 40% do custo de produção do alumínio primário.
A indústria levou o problema a Brasília e, no final do mês passado, foi tema de uma audiência pública na Comissão de Minas e Energia da Câmara dos Deputados. Ganhou o apoio do deputado paulista Arnaldo Jardim (PPS), que tem na área de energia um de seus focos de atuação parlamentar e aproveitou para criticar o alto custo da eletricidade no país. “A competitividade da indústria de base brasileira foi ferida de morte pelo próprio governo”, escreveu, logo depois do encontro. “Os preços do minério de do alumínio são ditados pelo mercado global, mas o preço da energia é determinado no mercado interno.”
O setor propõe redução de impostos sobre a eletricidade, menos restrições a produtores independentes de energia — que perderam peso no modelo atual de leilões — e, de imediato, tarifas sobre a importação de lingotes de alumínio. “Estimamos que o consumo nacional cresça 7% a 8% ao ano até 2025, quando estaríamos consumindo 3,2 milhões de toneladas por ano”, argumenta o presidente da Abal. “E esse crescimento terá que ser atendido com importações”, conclui. No ano passado, o superávit comercial na venda de alumínio e seus produtos foi de US$ 110 milhões, um terço do registrado no ano anterior.
O presidente do Sindicato dos Metalúrgicos de Poços de Caldas não compartilha com a visão. “As empresas têm participação em consórcios de hidrelétricas e acesso a energia mais barata, mas preferiram ganhar dinheiro vendendo a R$ 822 por MWh no mercado de curto prazo. Tiveram dinheiro do BNDES e do governo, mas não deram qualquer contrapartida em manutenção do emprego ”, acusa Angelino.
No final das contas, reconhece ele, em um mercado dominado por multinacionais, as decisões sobre onde produzir se baseiam exclusivamente no custo. “O que mais me deixa indignado é que essa mesma empresa permanece extraindo o minério para beneficiar em outro lugar”, lamenta.
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